quarta-feira, 11 de setembro de 2013

A DÚVIDA NÃO É CRUEL AO CÉU ABERTO DO CEU

Faz muito tempo que não passo por aqui.
Estava com saudades mas confesso que também morrendo de preguiça.
Preguiça de pensar para escrever com coerência.
Neste período de  mais de dois meses muitas coisas acontecera.
MUITAS!
Ian começou a engatinhar, teve sua primeira febre por uma infecção no ouvido, fui fazer um longa metragem no Espirito Santo onde a estrela do filme, Paloma Bernardi, viveu com Ian um romance tórrido e breve, fomos a Visconde de Mauá nas férias, encontrei um tatu bola no coco de Ian, meia centopeia em uma mão e a outra metade em sua boca, comemoramos o primeiro ano de vida do Bolão em uma festa deliciosa, vivemos a preocupação de sua primeira queda da cama, aprendeu a beijar, desaprendeu a falar mamãe, reaprendeu, desaprendeu a gostar de vários alimentos, passou a não aceitar mais ser alimentado pelas minhas mãos nem as de Galdino, só aceitou comida servida pela vovó Regina entre outros eventos que fazem do meu trabalho um parto.
Muito tempo, muitos acontecimentos, muitos assuntos... Fica difícil organizar e selecionar.
Quanto mais opção maior é a dúvida. E a dúvida é cruel.
Dúvida cansa.
Quanto mais se pensa mais se sofre e é por isso que a ignorância é a mãe da felicidade.
E dia 7 de Setembro, indo fazer uma apresentação de "Meu Trabalho é um Parto" no CEU Paz, na Brasilândia, lááááááááá no alto do morro de uma das comunidades - ai que preguiça dos termos politicamente corretos, comunidade o escambau, é favela mesmo !!! - mais perigosas, sujas e surreais do Brasil, me peguei pensando na diferença de comportamento dos sentimentos que habitam os corações e as mentes nas diferentes classes. Mais uma vez me peguei pensando que depressão de forma geral incluindo a PÓS PARTO, é coisa de classe média.
Subir o morro dentro da van com equipe técnica e produtora, vendo pela janela os moradores da Brasilândia em seus afazeres de um sábado de feriado mexeu comigo. Muitas mães carregando suas crias no colo e andando no meio daquele amontoado de construções irregulares, lixo, motos de montão, pequenos ônibus da prefeitura que não passam pelas ruelas promovendo um trânsito inacreditável e pessoas cheirando cocaína a céu aberto.
Essas mulheres não me pareceram preocupadas com os exemplos expostos a seus filhos, não me pareceram tensas nem mesmo infelizes.
Talvez seja pelo fato de elas não terem dúvidas, e não tem dúvidas por não terem opção.
Ou é aquilo daquele jeito ou é aquilo daquele jeitinho mesmo.
Não acredito que elas se angustiem ao ter que decidir com quem deixar os filhos para voltar ao trabalho após uma suposta licença a maternidade. Não tendo vaga em creche é com a mãe que deixam os filhos e se a mãe não pode é com a irmã ou com a vizinha e se uma vizinha não pode é com a outra e não há questionamento algum se a pessoa que cuidará da criança está apta a estimular de forma correta, limpar de forma correta, alimentar de forma correta...
O que é correto ?
Isso não existe. Existe o que é possível e o mais incrível; sem culpa alguma.
Bem diferente de nós da "Zona Oeste" que nos culpamos até pelo açúcar mascavo, mesmo que orgânico da bolacha de vários grãos e farinha integral da marca Mãe Terra.
Sei de histórias de mulheres de comunidades que se sentem estranhas no puerpério, e por absoluta falta de informação e de espaço em suas vidas para receber, aceitar entender e cuidar da "coisa estranha",  não dão atenção ao que sentem e um dia essa "coisa estranha" passa.
Porque passa mesmo! Com remédio, sem remédio, com terapia ou não; um dia a depressão pós parto passa.
Graças a Deus porque essa coisa estranho é ruim de mais de sentir. Mas quando se tem mais filhos, marido, casa, emprego e horas e horas de transporte público para chegar ao emprego, a "coisa estranha" não recebe atenção e não se desenvolve.
Tive depressão pós parto. Ela foi real e genuína mas tenho certeza que ela foi potencializada pelo meio que vivo, pessoas que me relaciono, opinião de familiares e informações que recebo com leituras variadas.
Depressão pós parto é hormonal, é químico é fisiológico mas é também doença de classe média intelectualizada.
Sei que minhas angústias relacionadas à minha carreira. a transformação do meu corpo depois da gravidez e tudo relacionado a Ian seriam menores ou nem existiriam se antes delas tivesse que me preocupar com ter o que comer.
Pobre não tem carreira, pobre tem trabalho e não ter a preocupação pelo espaço que se ocupa no mercado a través do desenvolvimento de uma carreira facilita muito.
Mulheres com carreiras sofrem mais que mulheres que labutam pelo dilema maternagem X profissão.
Quando vivi em Londres e levava uma vida pobre em que acordava ás 5:00 da manhã para fazer faxina, estudava a tarde e trabalhava como garçonete a noite, eu não me permitia deprimir pois eu não tinha saída. Muitas vezes eu acordava na escuridão do inverno Londrino ás 5:00 da "madrugada", sentia uma profunda tristeza, vontade ZERO de levantar para ir trabalhar, um desejo enorme de chorar, chorar, chorar e continuar dormindo mas eu não podia me dar ao luxo de me atirar nas profundezas da depressão. Eu tinha contas caras a pagar e precisava levantar para faxinar a casa de Mrs. Dorren entre outras várias inglesas, francesas, árabes  residentes da terra Londres de ninguém.
Em Londres eu cheguei a conclusão de que pobre não tem depressão. Na verdade em Cuba eu desconfiei,em Londres tive certeza e no 7 de Setembro da Brasilândia vi que continuo concordando comigo mesma!
A depressão é muito amiga do ócio, e quando se tem  que ir para a labuta, caso contrário não haverá comida na mesa, não há espaço para depressão alguma se instalar.
Procriar é mais antigo que andar para frente. A princípio não há mistério algum e nem motivo para muito filosofar.
Porém o mundo capitalista deu um jeitinho de tornar o ato mais natural da existência em algo digno de muita elucubração publicada em livros, blogs, sites e teses.
E nós das classes favorecidas com acesso a informação somos as grandes vítimas de tudo isso.
Ler de mais, pensar de mais e saber de mais em alguns casos não faz nada bem.
E para as classes sem acesso a informação as coisas são como são e ponto.
Engravidar, parir, voltar a trabalhar, colocar na creche, ver crescer é a vida e não um grande evento relatado em um Blog que é exatamente o que eu venho fazendo desde que resolvi ser mãe.
Faço parte disso de forma expressiva!
Outro dia estive com uma amiga que estava super agoniada, angustiada mesmo, por não saber em qual escolinha colocar seu filho de pouco mais de um ano. A dúvida era entre a Alecrim, Espaço Brincar, Arte de Ser, Quintal do Zé Menino, Grão de chão... Se ela não tivesse condições de colocar seu filho em escolas como essas, a creche publica seria a única solução e a dúvida estaria sanada.
Não que eu quisesse ter dificuldades financeiras, mas dinheiro apesar de delicioso e  maravilhoso e de eu ADORAR, traz dúvida e dificulta as decisões.
E como eu já disse láááááa em cima; a dúvida é cruel.
Estranhamente, depois que comecei a fazer terapia e ser medicada parei de escrever minhas impressões da vida de mãe neste espaço. Passei a falar de forma direcionada com minha psicóloga Junguiana/Bioenergética o que vem me ajudando muito em todos os sentidos. Profissional, social, conjugal, familiar e maternal.
Estar na mão de bons profissionais  fez e faz toda a diferença. E voltar a trabalhar com condições emocionais para tal foi crucial.
Voltar a ganhar dinheiro além de necessário é gostoso de mais! Poder colaborar com o orçamento familiar... Nem Mastercard !
Estou certa de que a combinação remédio/terapia/trabalho/dinheiro não são os únicos ingredientes de uma depressão pós parto solucionada com sucesso.
Dormir melhor é também uma questão FUNDAMENTAL !!!!!
Suponho que quem me lê esteja pensando: " Nossa! Que legal ! Ian aprendeu a dormir a noite inteira, Veridiana resolveu a questão SONO de uma vez por todas".
Não meus caros leitores! Isso não é uma verdade...
Mas como iniciei o post falando em escrever com coerência, deixo o tema recorrente para o texto seguinte e assim não misturo os assuntos.
Mas darei uma dica para aquecer as curiosidades de vocês mulheres !
Na tentativa de tirar Ian de nosso quarto, há quase 3 meses ele está em nossa cama...
Estou aproveitando para escrever agora que Ian dorme profundamente seu soninho da tarde. Estamos na minha mãe e na casa da vovó seu sono é melhor. O motivo nunca saberemos pois aqui não há nada de especial a não ser o fato de ser a casa da vovó: especialidade por excelência.
Ôpa ! Ian acordou...


                                           Ilha de Guriri - ES- Julho de 2013

Obviamente não terminei o post no dia seguinte ao da Independência do Brasil que estive no CEU Paz. Afinal... Ian acordara...
Já Passei pelo CEU Jardim Paulistano, também na Brasilândia mas sem cocaína a céu aberto, e no momento estou no CEU Casa Blanca tentando fazer das horas de espera para a montagem de luz um tempo produtivo.
Decepcionada, triste e revoltada com meu técnico de luz que não compareceu no horário marcado por ele mesmo na casa da minha mãe, ponto de partida da equipe de "Meu Trabalho é um Parto".
Da Agostinho Cantú no Butantã onde nasci e onde fica meu cenário, partimos a cada CEU  na Van de Milena, minha mais nova amiga e operadora de luz.
Meu operador de luz não compareceu para trabalhar e também não deu satisfação alguma. Soube há pouco por conhecidos que meu EX técnico é viciado em crack e nunca ninguém me avisou.
Que pecado ! Que lástima ! Coitado ! Que pena e que raiva ao mesmo tempo !
Deve ter caído em uma noitada negra e não saiu da escuridão até agora.
Hoje Ian ficou com meu amor, por coincidência seu pai, e foram juntos a aula de música que estou também há tempos para falar sobre. Sandra Oak e sua musicalização para bebês, sua pesquisa e trabalho de 16 anos em desenvolvimento merecem um Post exclusivo.
No 7 de Setembro quando estive no CEU Paz Ian ficou com minha mãe, por coincidência sua avó, e passou a tarde brincando com seus primos no delicioso jardim com amoreira, pitangueira, mamoeiro e jabuticabeira da casa onde cresci. Enquanto crianças bolavam baseado dentro do teatro em que eu me apresentava e outros cheiravam cocaína, Ian ralava e furava sua calça nos joelhos engatinhando pelo piso de pedra do quintal da casa da vovó.
Hoje Ian aprendia música enquanto eu levava o cano de um craqueiro...
Que ele demore muito para saber da existência das depressões, das diferenças de classe, das drogas e de tudo de desnecessário que pertence a esse mundão de meus Deus de Partos, CEUs e cocaína a céu aberto.
Agora vou me maquiar para entrar em cena.
Milena, a dona da Van e motorista que nos leva para os CEUs da cidade está na cabine de luz e som se preparando para sua estreia como técnica, está dilatada e com contrações para seu parto.
Ela vai operar a minha luz sob orientação de Robson, meu amigo ator e operador de som e  vai dar a luz.
Boa hora Milena !

" Parir é como estrear um espetáculo, a gente ensaia , se dedica, se entrega , se apaixona, dá nome ao grupo, à peça e depois de alguns meses ela nasce, ela estreia. E é por isso que eu brinco que meu trabalho é uma parto, porque nos embriaga das mesmas sensações "
(Texto da última cena de Meu trabalho é um Parto).
                                           Ian na casa da vovó Regina no dia 7 de setembro